Um olhar sobre a visão


Notícias 34 - 25 de novembro de 2011
"Ouvindo, ouvireis, mas não compreendereis, e, vendo, vereis, mas não percebereis. Porque o coração deste povo está endurecido, e ouviram de mau grado com seus ouvidos, e fecharam seus olhos; para que não vejam com os olhos, e ouçam com os ouvidos, e compreendam com o coração, e se convertam, e eu os cure. Mas bem-aventurados os vossos olhos, porque vêem, e os vossos ouvidos, porque ouvem. Porque em verdade vos digo que muitos profetas e justos desejaram ver o que vós vedes, e não o viram; e ouvir o que vós ouvis, e não o ouviram”. (Mateus 13:9-17)

E o que se entende por visão? É o ato de mirar os olhos em um alvo, mas será que é apenas isso?

Ver pode ser algo natural e inconsciente, o que faz com que não se reflita sobre o assunto. Por isso, muitos não observam que existem diversos aspectos envolvendo essa atividade que está além dos olhos. Ver é um combinado entre visão, percepção e memória.

No livro de Mateus, na Bíblia Sagrada, encontramos um capítulo que diz que pessoas viram e ouviram, mas não compreenderam, porque apesar de estarem expostas à mesma mensagem, bloquearam o entendimento em seu “coração” e não registraram aquele ensinamento em sua personalidade/caráter. Como isso ocorre fisicamente?

Segundo o poema “O Ovo” (Clarice Lispector), após olhar um ovo todos os outros ovos serão apenas a lembrança do primeiro. Esse é um processo de identificação que está intrínseco nos bebês e se desenvolve durante a vida. Cada vez que um humano se depara com algo desconhecido, ele registra seus aspectos visuais e sensoriais correspondentes, o que gera uma “memória visual”.

Nesse aspecto, dezenove personalidades falam sobre as deficiências visuais e o que engloba o olhar, um trabalho que resultou no documentário “Janela da Alma”. O título foi inspirado na frase de Leonardo Da Vinci: “O olho é a janela da alma, o espelho do mundo”. O filme relata as dificuldades e habilidades de pessoas que perderam parte ou totalmente a visão, como elas lidam com a falta desse sentido, as mudanças de identidade e quais são as emoções que envolvem a transformação da realidade.



Em “Um Antropólogo em Marte”, Oliver Sacks, um neurologista e antropólogo inglês, descreve a trajetória de Virgil Adamson, um homem que perdeu a visão aos três anos de idade, vítima de uma catarata, e fez uma operação para voltar a enxergar após 40 anos de cegueira. A operação foi um sucesso, mas faltava para Virgil a habilidade de reconhecer aquilo que era visto. Como não possuía um referencial, ele enxergava, mas não conseguia entender o que via. O dr. Sacks destaca:

“Não se vê, sente ou percebe em isolamento – a percepção está sempre ligada ao comportamento e ao movimento, à busca e à exploração do mundo. Ver não é suficiente; é preciso olhar também.” (Oliver Sacks – Um antropólogo em Marte – Pg. 132)

Virgil e outros pacientes deram provas de que a percepção capta um composto de cores, formas e movimentos, mas a interpretação para entender o que é visto é um processo cerebral que precisa ser aprendido e desenvolvido. Para os bebês, essa é uma reação espontânea, porém, nos adultos, o ato de ver tem ligação com os registros culturais que a pessoa carrega durante a vida, pois o cérebro faz correlações aos estímulos visuais.

Ao avaliar esses materiais é possível concluir que as pessoas não entendem exatamente as mesmas informações ao ficarem expostas a uma mensagem, principalmente quando ela é visual. Cada um terá uma forma de receber, entender e classificar uma mesma informação. Uma situação que exemplifica esse cenário é a reação de diferentes pessoas diante de uma exposição de arte. O fato é que a cultura e a forma de pensar a qual o homem é exposto interferem na interpretação daquilo que ele está vendo.

É nesse misto de ver e interpretar que a sociedade baseia alguns princípios, e desde a infância aprendemos a educar nossa visão, selecionando e dando significados a sua percepção de mundo. E o resultado desse processo é acrescentado ao repertório pessoal, fazendo parte de um ciclo que se agrega à personalidade.

Uma vez que o olhar traz consigo uma interpretação cerebral do que é visto, assim como ocorre com os outros sentidos (audição, tato, olfato e paladar) temos a opção de desconsiderar algumas coisas com as quais nos deparamos durante a vida. Conhece aquele ditado “O pior cego é aquele que não quer ver”?

Toda essa reflexão nos faz pensar sobre como temos interpretado o mundo e o quanto aproveitamos daquilo que vemos e aprendemos. Muitas vezes algo importante nos é dito ou mostrado, mas por causa de um coração endurecido, deixamos de prestar atenção ou de aplicar em nossas vidas algo que seria a chave para uma mudança excepcional... simplesmente porque “não quisermos ver/entender”.

Agora que você já viu, ou melhor, entendeu... que tal praticar? Algumas vezes coisas simples ao nosso redor reve
lam tantas coisas grandiosas... olhe para o céu, por exemplo. Outras vezes, vemos tudo com um "saber" superficial, e até através de rótulos "pré concebidos". Pense em como deseja "enxergar" o mundo a partir de agora. Não endureça seu coração e sua percepção. Vá além.


"Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara" (José Saramago – Ensaio sobre a cegueira)


Documentário Janela da Alma - Completo

Por: Claudia Giron Munck é Bacharel em Comunicação Social - Publicidade e Propaganda, Pós-Graduada em Comunicação Organizacional e Relações Públicas.

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